terça-feira, 2 de junho de 2009

A BONECA ESNOBE E A MENINA DA BONECA


Raramente me interesso pelos caminhos pelos quais trafega meu marido em busca do pão de cada dia. Tenho os meus interesses, as preocupações de minha vida . E embalada em meus progressos não há tempo para olhar para as paisagens.
Mas sei que ele caminha por caminhos por fazer e passa por pessoas esquecidas pela sorte.
E eu, que em geral não me emociono, quero contar de uma manhã de sol.
Por insistência dele, e não por vontade minha, o acompanhei certa manhã em carruagem. Belos cavalos brancos atiçados por um negro na boléia nos levavam pelos campos resplandecentes ao sol. Ao meu lado ele sorria contemplando meu rosto. Ao lado dele eu seguia fingindo alheamento, porque nunca suportei aquele olhar de encantamento sobre mim. Eu não sou fruto de um milagre, sou a expressão mais pura de minha raça branca, caucasiana. Questão genética apenas.
Quem me salvou daquele olhar foi um acidente. Uma roda se quebrou. Ele desceu para ajudar ao negro e eu me preparei para curtir minha impaciência.
E foi então que distraída, olhei pela janela.
E lá estava uma menina, sentadinha no barranco com os cabelos dourados.
Pobrezinha, maltrapilha. Com uma carinha de rato, a sapeca..
Ao lado dela uma cestinha e uma boneca no regaço.
E eu que nunca fui uma pintora, a guardei dentro de mim como um retrato.
A pobrezinha há de ser mais feliz do que eu.
Eu nunca fui sapeca.
Eu nunca tive uma boneca.

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